Em entrevista à DW, o jurista Fransual Dias alerta que pode estar em marcha um plano para adiar as eleições na Guiné-Bissau, depois do Governo anunciar o prolongamento do recenseamento. Aliás, a medida é “ilegal”, diz.
O Governo guineense anunciou esta quinta-feira (09.02) que vai prolongar o recenseamento eleitoral por mais duas semanas. O Conselho de Ministros não avançou os motivos para o prolongamento do recenseamento, mas, em entrevista à DW África, o jurista Fransual Dias suspeita de uma estratégia para voltar a adiar as eleições legislativas, marcadas para 4 de junho.
Antes disso, o escrutínio esteve marcado para 18 de dezembro de 2022, mas o Governo pediu o adiamento devido à “impraticabilidade” da data.
O antigo primeiro-ministro guineense e líder do FREPASNA, Baciro Djá, avisou na quarta-feira que uma possível prorrogação do recenseamento eleitoral atentaria contra a lei. “É muito grave”, afirmou Djá. O jurista Fransual Dias concorda.
DW África: O Governo guineense violou a lei ao prolongar o recenseamento eleitoral?
Fransual Dias (FD): O Governo está a violar a lei, mas quem o faz ainda mais é o Presidente da República, que devia ser o garante da Constituição e das leis. Porque quem solicitou o prolongamento do recenseamento eleitoral foi Umaro Sissoco Embaló.
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Se fizermos as contas, o recenseamento só vai acabar a 25 de fevereiro. Depois disso, entraremos no processo de validação das candidaturas, que não leva menos de 20 dias; a seguir, virá o período da reclamação das candidaturas dos partidos políticos, que poderá ser entre 5 a 10 dias, dependendo do Supremo Tribunal de Justiça (STJ). E posteriormente haverá a afixação definitiva das candidaturas. Ou seja, a conclusão desse processo será entre 25 de abril a 10 de maio, incluindo o recenseamento, a triangulação dos dados, a validação das candidaturas e afixação definitiva das candidaturas.
Depois, entra-se no período da inalterabilidade do caderno eleitoral, que é exclusivamente relativo à gestão dos dados e não pode coincidir com qualquer outra atividade a não ser os 21 dias da campanha eleitoral.
DW África: A data prevista para as legislativas, 4 de junho, está em risco?
FD: Feitas todas as contas, podemos estar em cima do prazo de 4 de junho e, atendendo à questão ainda por resolver da [composição da] Comissão Nacional de Eleições, acho que provavelmente há uma intenção de voltar a adiar as eleições.
DW África: A lei prevê o prolongamento do recenseamento?
FD: A lei não prevê a prorrogação do recenseamento – prevê que o recenseamento eleitoral no território nacional deve decorrer no espaço de dois meses. E o Governo até fez bem: começou o recenseamento a 10 de dezembro passado [para terminar a 10 de fevereiro]; o recenseamento no exterior é feito em três meses.
Agora, é um pouco estranho ter começado o recenseamento antes e prolongar agora o processo.
DW África: Segundo os últimos dados oficiais, mais de 86% dos eleitores já se recensearam. Porquê prorrogar o recenseamento por mais duas semanas?
FD: O critério normal internacional é que, quando há 75% de eleitores registados, isso já é razoável para a validação dos dados do recenseamento. Porque não é possível recensear todos os cidadãos – o que se pretende é que haja dados referentes a 75% dos eleitores que permitam a validação.